Na internet, ninguém sabe que você é um ser humano

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Embora não sejam uma prioridade, o Manual do Usuário está presente em algumas redes sociais:

Twitter

Telegram

Mastodon

Desde o início, tentei dar um tom mais pessoal aos nossos perfis nas redes a fim de diferenciá-los de outros similares que adotam a fórmula “título do post + link”, esses quase sempre automatizados.

Nos do Manual, escrevia textinhos originais, mais detalhados que os títulos — às vezes, detalhados o suficiente para entregar toda a informação ali, nos 280 caracteres do Twitter. No Telegram, destacava palavras-chaves com negrito, a fim de facilitar a identificação do assunto em questão e chamar a atenção ao que importa.

Tinha comigo que esse cuidado era reconhecido, mas… parece que não?

Na última segunda-feira (13), criei uma conta para o Manual no IFTTT e automatizei a publicação de novos posts do site no Twitter e no Telegram — a mesma fórmula que quase todo mundo usa.

Uma semana depois, quando questionadas a maioria das pessoas disseram não ter notado a diferença ou se importado com a mudança. Os números frios, porém, mostram diferenças significativas de comportamento das nossas bases de seguidores. Façamos uma breve análise, pois.

No Twitter, comparei a semana fechada de automação (13 a 19 de junho, na coluna em azul) com a média das cinco semanas imediatamente anteriores. Veja:

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Os engajamentos cresceram, embora acredite que a enquete da última sexta (17) tenha inflado esse indicador. A quantidade de cliques em links também cresceu, outra discrepância justificada: os posts no Twitter automatizados são limitados ao título, que nem sempre passa informação suficiente ao(à) leitor(a), o que o(a) motiva a clicar para saber mais.

Seria ótimo se tivéssemos algo a ganhar com mais audiência bruta no site, mas não é o caso. Nada no Manual é vendido, mensurado ou precificado com base em audiência bruta, justamente para não incentivar o caça-clique.

As respostas diminuíram bastante, relativamente, ainda que em absoluto os números anteriores já fossem baixos. RTs e curtidas, métricas mais “frias”/mecânicas, também tiveram baixas consideráveis (-49% e -34,5%).

O analytics do Telegram é mais difícil de manipular e não deixa filtrar por semanas — o menor intervalo possível é de 16 dias. Em uma semana, o saldo de novos seguidores aumentou em oito, o que considero bom, visto que no Telegram a retenção é mais difícil e não é raro o número total de seguidores passar semanas ou até um mês andando de lado.

O que mais me surpreendeu nesse experimento, porém, foram as enquetes que fiz na sexta (17) perguntando a quem acompanha o Manual nesses canais o que acharam da mudança.

No Telegram, foram 429 votos. Mais da metade (52%) não percebeu a mudança de estilo/tom e quase 1/4, ou 23%, percebeu, mas não viu vantagem nem desvantagem — tanto faz.

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Talvez esses números fosses ainda maiores se eu tivesse desligado antes a opção do IFTTT de encurtar os links. Fiz isso na sexta, após um leitor reclamar. Sem o link encurtado, os posts ficam ainda mais parecidos com os que eu redigia manualmente.

No Twitter, a participação foi menor, mas a vitória dos desatentos e indiferentes foi de lavada. Dos 96 respondentes, 81,3% não viu diferença na automação e 9,4% reparou, mas não ligou.

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No Twitter, apenas 4,2% achou a mudança ruim. No Telegram, 16%.

De um universo de 525 pessoas, cerca de ~70 acharam que a mudança piorou as nossas redes.

É pouco, mas existe a hipótese de que a maioria que não se importa ou não reparou talvez sinta a diferença a longo prazo, num nível quase subconsciente. Talvez eu refaça essa análise daqui a algumas semanas, com mais dados da fase automatizada para analisar.

Um último comentário, do porquê eu ter feito essa mudança.

O Manual do Usuário tem muitas partes móveis, muita coisa que demanda a minha atenção ao longo do dia. São raras as tarefas monumentais, mas sobram micro-tarefas que, numa redação de uma pessoa só, se acumulam e tomam a minha agenda, às vezes comprometendo um tempo que poderia ser dedicado ao que importa — a produção de notinhas, matérias, de conteúdo para o site.

Vi na automação uma oportunidade de me livrar de uma dessas micro-tarefas. Imaginava que, após uma semana, teria uma decisão difícil a tomar, mas — surpresa! — na internet (ou nas redes sociais) quase ninguém liga se você é um ser humano ou um robô.

Isso corrobora a impressão que tenho, de longa data, de que redes sociais achatam tudo, nivelam por baixo. É, como diriam os norte-americanos, uma “race to the bottom”, uma corrida ao fundo do poço.

Manterei a automação por ora.

Para quem segue o Manual no Mastodon, no domingo (20) ativei o “cross-poster”, que puxa posts no Twitter automaticamente. Nas duas redes, ativei a sinalização de que os perfis do Manual são alimentados por automação, ou seja, que são robôs.

Virei um robô nas redes sociais para que possamos ter diálogos mais humanos em lugares mais saudáveis da internet, como o site e a newsletter. A mim parece uma boa troca.

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