Postado em 31.07.2022 00:00
Autor(es): Letícia Lanz
Editora: Objetiva
Páginas: 130
Idioma: português
ISBN-13: 9786557825655
ISBN-10: ?
Esse livro narra a história da autora, mulher transgênero, que decidiu transicionar aos 50 anos de idade após um infarto que a fez perceber que não era viável continuar vivendo como vinha até aquele ponto.
Ser você mesma é algo que pode ser reprimido e recalcado, mas nunca riscado da sua lista de desejos absolutamente fundamentais. O destino de cada pessoa é ser e se expressar no mundo tal como ela é. Essa é a principal, talvez a única, razão de ser da existência humana, e ninguém vai se livrar de ao menos tentar realizar essa tarefa enquanto estiver viva.
Por mais que o nosso desejo pareça abominável aos olhos da sociedade, tudo que temos a fazer, se quisermos ser criaturas minimamente equilibradas e felizes, é correr atrás dele, com todas as nossas forças. Como propôs Lacan, a única coisa da qual se pode ser culpado é de ter desistido do seu desejo.
A narrativa começa com a infância da autora, período em que ela já era pressionada por um sentimento de inadequação muito forte.
Desde a minha primeira volta nos sapatos de salto da minha mãe, a percepção que me acompanha é que eu faria um favor enorme ao mundo não sendo quem eu sou.
O livro não é meramente um relato autobiográfico das dificuldades enfrentadas por uma pessoa transgênero, os capítulos também são recheados com as reflexões da Letícia sobre papéis de gênero e o caráter revolucionário da transição de gênero. Esse último aspecto só fui enxergar após essa leitura.
A crença comum entre pessoas transgêneras é que realizar a transição de gênero implica a adoção integral de padrões de conduta e papéis sociais determinados pelo binarismo de gênero. Tal procedimento elimina o caráter transgressivo e revolucionário da transição de gênero, fazendo dela nada mais do que simples readequação da pessoa ao arbitrário e opressivo dispositivo binário de gênero vigente na sociedade.
O paradoxo é que, para tornar-se alguém perfeitamente passável, é preciso abdicar inteiramente de qualquer visibilidade social como pessoa transgênera. A pessoa deve diluir-se no contexto geral da sociedade [...]
É um texto muito franco. A autora não tem problemas em admitir, por exemplo, que sentiu alívio ao descobrir que o pai mantinha uma segunda família porque isso o tirava do pedestal de pessoa perfeita...
O pai que, durante toda a minha vida, tinha sido o bastião da moral e dos bons costumes, aparecia agora como uma pessoa comum, sujeita aos desejos e às falhas de qualquer mortal.
ou que projetava na esposa a feminilidade que não conseguia realizar, o que felizmente não resultou em separação, mas gerava conflitos entre o casal.
Eu buscava realizar nela a mulher que eu não tinha forças para realizar em mim. Na perspectiva do olhar masculino,
Recomendo especialmente para pessoas cis, que frequentemente ficam a vida inteira sem conhecer as dificuldades enfrentadas pelas pessoas transgênero ou sem questionar papéis de gênero.